CAPÍTULO VII

Voltando para casa

- Eitcha! Coisa boa seu sistema de transporte. Não tem como se acostumar com isso.

- “Oxente”, esse menino! Virou baiano?

- Eu estou é “boiando”! Onde estamos agora?

- Na colônia Boa Nova, seu novo lar.

- Que jardim maravilhoso. É parecida com Pacífica. Mas aqui eu posso respirar normalmente. Lembro de você ter me dito que todos os desencarnados tem que passar pelo umbral, eu não vou passar por lá?

- Você está no umbral, Dinei, esta é uma colônia umbralina.

- Mas você havia dito que quase não tinha luz no umbral.

- Eu lhe falei das diversas regiões que aqui existem, numa ponta há ausência de luz, em outra ponta a luz é como o entardecer, lembra? Pois bem, você está na ponta iluminada.

- Mas a luz é mais forte que a de um simples entardecer, apesar de não estar vendo o sol daqui onde estamos.

- É verdade, isso se deve ao alto grau espiritual em que esta colônia se encontra. Sua vibração superior, apesar de sua localização, ilumina seus limites um pouco além do normal para as regiões umbralinas.

- E eu realmente mereço estar aqui?

- Não exatamente. Você veio para cá por causa de suas necessidades. Esta é uma colônia de engenharia encarnatória.

- De quê?

- Bioengenharia, Dinei, genética. Aqui são criados corpos e onde se modifica os perispíritos dos que irão reencarnar.

- Nossa! De todos que nascem?

- Não. Apenas dos que tem o mesmo grau de evolução. Cada plano tem suas necessidades, e sua bioengenharia.

- Que coisa mais complexa de se pensar. Estou louco para aprender mais sobre isso. Estou me sentindo um pouco cansado, Daniel, podemos descansar um pouco?

- Venha, vou levá-lo ao seu alojamento e apresentá-lo a algumas pessoas. Você também conhecerá algumas das pessoas que nos ajudaram em nossa caminhada.

- Que bom. Vou ficar feliz em agradecê-las por tudo que fizeram.

- Elas estão felizes com seu progresso. Teem grandes esperanças no seu futuro.

- Eu espero corresponder a isso. Sei você me contará o que eu devo fazer por aqui, e farei o máximo para não decepcionar. Nem você, nem seus amigos.

- Eu sei, meu querido irmão, nunca duvidei disto.

- Não vejo animais por aqui, onde estão?

- Diferentemente de Pacífica, Dinei, onde várias espécies inteligentes do universo se encontram, aqui os animais não existem da mesma forma que lá. Neste plano da existência os animais ainda não encontraram o raciocínio, ainda não são individualidades completas, falta-lhes o princípio inteligente, o espírito.

- Animal não tem alma?

- Tem, mas uma alma coletiva.

- Essa ficou difícil!

- Eu explico. No nível de evolução no qual a Terra se encontra, a forma humana é o mais alto grau de aperfeiçoamento orgânico, matéria necessária para vestir um espírito já consciente, inteligente, pensante, como o espírito humano. Já as formas dos animais ainda não se prestam, no atual estado evolutivo deste plano, para este fim. Aqui o princípio inteligente está em forma latente, não completamente individualizado. Neste caso, a evolução dos animais toma outro caminho. Assim que eles desencarnam, em vez de viverem na erraticidade como os humanos, são quase imediatamente reencarnados. Chamamos de alma coletiva o princípio universal que regem as leis que se aplicam a eles. É como se fosse uma grande alma abrigando todos os animais de uma só vez. A eternidade, Dinei, é pródiga em maravilhas. Nunca se esqueça de uma verdade simples: A verdadeira evolução é moral, espiritual, a forma material muda bilhões de vezes pelo universo afora, mas a centelha Divina é imutável.

- É uma pena que eu não possa compartilhar da companhia dos meus animaizinhos de estimação depois de desencarnar. Mas Daniel, eu li sobre a aparição de vários animais depois de desencarnados, não era verdade?

- É verdade sim. Mas são raros estes casos e só aconteceram para servirem a algum propósito específico, Dinei. Nosso Pai, em Sua Infinita Bondade, pode se auxiliar destes pequeninos para ajudar espíritos com essa necessidade. Às vezes o apego ao animal é tão grande, que se torna necessário plasmar a forma anterior do animal para consolar e ajudar o espírito que sofre.

- São tantos os caminhos, tantos segredos...

- Sim. Porém não há nada que um dia não seja revelado, é só uma questão de estar pronto, tudo está no seu tempo ideal. Lembre-se que não há atraso na Mente Divina.

- Isso é consolador. Mas os livros escritos por Allan Kardec não foram uma revelação destes segredos?

- Sim. Mas foi revelado apenas um parágrafo em comparação com as milhões de páginas do Livro da Vida.

- Entendi...Que lindo este edifício. É aqui que eu vou ficar?

- É. Vamos entrar.

- Que atmosfera gostosa, Daniel, já me sinto muito melhor.

- Aqui é um hospital, Dinei, seus bons fluidos já se fazem sentir.

Doutor José, o administrador da colônia vem recebê-los no saguão do hospital.

- Daniel! Dinei! Sejam bem-vindos! Já estava com saudades.

- Doutor José! Enfim chegamos. Que bom abraçá-lo!

- Dinei. Que bom que chegaram a bom termo seus ensinamentos, eu acompanhei sua jornada com muito interesse, e estou orgulhoso dos dois!

- Obrigado doutor José. O senhor é um dos que o Daniel falava que estavam por perto?

- Sim, pode-se dizer que eu era um daqueles. Mas não fui o único, muitos ajudaram, Daniel só faltou falar com Nosso Pai pessoalmente para que seu projeto vingasse, por isso estou contente com os resultados, assim poderemos sossegar um pouco por aqui.

- Exagerado.

- Creio que agora vou poder entender porque meu querido amigo fez tudo isso por mim, né?

- É tudo muito mais simples do que parece, Dinei, você verá. Venham, vamos para o seu aposento para que você possa descansar um pouco, amanhã teremos um dia cheio.

- É bom. Estou louquinho por uma cama, estou morto de cansaço. Morto mesmo!

- Eis seu quarto, é simples, mas, confortável.

- É perfeito. Muito obrigado doutor José. Aliás, muito obrigado por tudo que o senhor tem feito por mim, mesmo eu não sabendo o quê exatamente. Muito obrigado mesmo.

- Não precisa agradecer, Dinei, quando lhe ajudamos estamos ajudando a nós mesmos, em uma corrente de amor não há elos fracos ou fortes, só a corrente em si mesma existe para o bem de todos. Agora descanse. Amanhã viremos para continuarmos seus preparativos, fique com Deus.

- Bom descanso Dinei, até amanhã.

- Até amanhã doutor. Daniel, já faz tempo que a gente não se separa, né? Tudo bem, eu estou tranqüilo, mas, você vai estar aqui amanhã de verdade, né? Posso confiar? Não que eu esteja com qualquer dúvida, porém, você sabe, eu não conheço ninguém por aqui e...

- Dinei cala a boca e dorme!

- Ta bom! Ta bom! Tchau para vocês.

Daniel e o Doutor deixam Dinei descançar. Doutor José tem uma notícia não muito boa para dar a Daniel.

- Ele está um pouco inseguro, coitadinho.

- Mas ele reage rápido, Doutor José, amanhã ele vai lhe enlouquecer com um milhão de perguntas, você verá.

- É verdade, por isso me afeiçoei tanto ao menino ao acompanhar seus estudos, ele é um bom rapaz. Mas nos resta pouco tempo, Daniel, temos que nos apressar para sua encarnação, é possível que tenhamos um pequeno contra tempo quanto ao seu nascimento na Terra.

- Não estou sabendo de nada. O que aconteceu?

- Não quisemos lhe preocupar para não interromper seu trabalho na Terra. A Mãe dele poderá ter que dar a luz um mês antes por problemas de pressão. Estamos monitorando seus sintomas, porém não podemos fazer muito neste caso, é cármico.

- Pena. Pensei que teria mais um pouco de tempo para prepará-lo melhor. Mas tudo bem, ele vai conseguir.

Dois dias depois Daniel volta ao quarto de Dinei.

...Bom dia Dinei!

- Nossa! Já? Parece que nem dormi...

- Pois é, seu preguiçoso. Você dormiu dois dias seguidos!

- Incrível! Dois dias. Mas me sinto cansado ainda, Daniel...

- Eu sei como você se sente meu irmão, mas isso é normal, você está começando a se adaptar ao seu futuro.

- Meu futuro?

- Sim. Você está no princípio do processo reencarnatório.

- O quê?

Pego de surpresa, Dinei mostra seu velho temperamento.

- Calma.

- Calma? Eu mal cheguei e já vou voltar? O que eu sou? Uma bola de ping-pong? Eu sou obrigado a voltar? Cadê os meus direitos? Eu não vou!

- Meu irmãozinho, eu vou explicar o porque da sua volta tão rápida, você compreenderá tudo e aceitará com boa vontade, tenho certeza.

- Pois eu não tenho certeza nenhuma! E a culpa é sua. Você me mostrou coisas maravilhosas, outros mundos, e quer que eu aceite voltar para aquele inferno? Mas nem se o Lula cortar a barba!!!

- Todos os eventos que virão serão para o seu bem Dinei. Você não sabe a sorte que tem. Muitos esperam anos pela oportunidade de reencarnar e resgatar seus débitos. Você acha que voltar é ruim porque não compreende suas necessidades, mas vai entender. Vou explicar o melhor que puder.

- É, você sempre acaba me convencendo mesmo, mas desta vez não vai ser fácil, eu não quero voltar, eu quero ir para Pacífica, quero rever o Terno, e tudo mais!

- E o único modo disso acontecer será através do bom aproveitamento das suas vidas na Terra.

- Vidas?

- Sim Dinei. Você ainda está muito longe de poder viver em planos superiores a este que estamos, mas com o tempo você poderá escolher viver lá, ou não, existem incontáveis mundos que você ainda desconhece, que são também maravilhosos.

- Mas quantas vidas?

- Talvez uma, talvez um milhão, só depende do seu progresso. Já esqueceu tudo o que conversamos?

- Não, eu sei que só depende de mim, mas não posso progredir por aqui mesmo?

- Sim, mas não o suficiente, você precisa provacionar o que aprendeu, realizar a teoria, praticar. E só na terra você conseguirá isso.

- E se eu falhar? E se não conseguir melhorar meu espírito? E se eu piorar?

- Eu acredito que você vai conseguir, Dinei. Mas mesmo que não consiga, não se preocupe, haverá sempre uma nova chance, o Amor do Nosso Pai é Eterno. Nesta última encarnação você melhorou muito, perdeu muitas oportunidades, é verdade, porém, em comparação com a anterior você deu um grande salto. Isto já é um grande incentivo, não acha?

- O que eu fui na encarnação anterior? Posso saber?

- Pode só em geral. Você foi um homem um pouco violento, com alguns vícios, era mulherengo e pouco estudioso. Morreu de forma violenta, quase um suicídio não planejado. Mas foi também bom com os necessitados, era fazendeiro e tratava com justiça seus empregados e familiares.

- E onde você entra nesta história?

- Eu não estava com você, nós nos separamos bem antes.

- Quando? O quê nós fomos em vidas passadas?

- Nós estivemos por muitas encarnações ajudando um ao outro Dinei. Nós já fomos inimigos, amigos, parentes e até marido e mulher.

- Nossa! Você já foi mulher?

- E você também. Nossa última encarnação juntos fomos pai e filho, na idade média, em Portugal. Então nos separamos, eu consegui aproveitar melhor minhas vidas na Terra e pude então progredir mais rápido, mas nunca esqueci o meu amor por você e sempre que podia tentava lhe ajudar, fui até seu mentor em uma das suas vidas. Sempre que você voltava ao umbral eu estava lá lhe esperando, com outros amigos seus.

- Então é isso, somos almas gêmeas?

- Almas gêmeas não existem, somos sim grandes amigos, espíritos afins. Fizemos há muitos séculos uma promessa de ajuda mútua, e nós sempre a cumprimos e a cumpriremos sempre, por toda a eternidade.

- Por isso seu amor por mim, e a minha admiração por você. Gostaria de conhecer melhor minhas outras vidas...

- Se você tivesse mais tempo para ficar aqui, elas viriam a sua memória naturalmente, aos poucos, mas não se aborreça com isso, está tudo guardado em seu espírito e você lembrará delas no momento oportuno.

- Por que você não me contou estas coisas antes? Eu poderia me preparar melhor para esta notícia besta!

- Se você está reagindo assim agora que compreende algumas coisas, imagine só como seria se eu lhe tivesse dito antes...

- Mas Daniel, ainda não sei quase nada e não me sinto preparado para enfrentar a barra das coisas da carne lá embaixo, ou aí do lado, sei lá! Eu preciso ficar mais um pouco, ajudar minha família, aprender mais.

- Calma, meu irmãozinho, ainda não lhe contei tudo. Você reencarnará no seio da sua família de novo, e terá sua irmã Elisabeth como mãe.

- O quê! Quer dizer que o filho que ela está esperando sou eu? O meu sobrinho sou eu? Eu sou meu próprio tio? Aí minha cabeça...

- Está vendo como é simples? Você vai poder ajudar muito a sua família, e com uma mãe espírita praticante, você irá crescer dentro dos ensinamentos do Espírito da Verdade, estudando o que você estudaria aqui, só que melhor, já estará saldando dívidas cármicas e praticando o que estiver aprendendo.

- Oh! Sim! É tudo muito simples. Como você sabe que eu vou seguir as regras desta vez? Tudo bem quanto a minha irmã, ela vai me amar muito, tenho certeza, mas, e eu? E se eu for cabeça dura de novo?

- Você terá toda uma vida para mudar alguns comportamentos, Dinei. Você nascerá sem vícios, já os eliminou nesta encarnação, e, com as impressões de amor que você recebeu, seu coração estará bem mais preparado para absorver as lições que a vida lhe der.

- Eu não sei Daniel, mas já que tem que ser...O que eu devo fazer agora? É estranho, mesmo dormindo tanto eu continuo cansado, esquisito...

- Tem que ser, meu irmão, e é uma alegria vê-lo voltar tão rápido. Quero que você guarde em seu coração tudo o que aprendeu e viu, pois um dia será chamado a escrever sobre as coisas da espiritualidade, para que o conhecimento se espalhe mais e mais sobre a Terra.

- Meu destino é ser escritor na próxima vida?

- Destino não, tarefa. Você deverá escrever como exercício do que aprender e praticar, talvez você venha a ter outra profissão que não a de escritor, porém deverá escrever, não se esqueça.

- Ô! Pode deixar! Como se fosse fácil!

- Mas que rapazinho enfezado! Venha comigo, vamos dar um passeio.

- Vamos lá.

- Dinei! Você vai vestido assim?

- Opa! Acho melhor colocar uma roupa.